Ângelo Paupério
Curador da Exposição “Eu sou... Cargaleiro”
UM MUNDO MELHOR
“Eu sou … Cargaleiro”, é uma homenagem. Uma homenagem simples como a sua natureza.
Pretende mostrar o artista nas suas diferentes artes, na cerâmica, no desenho ou na pintura, a que se dedica com determinação há mais de 7 décadas.
Cargaleiro pinta todos os dias. Sem folga de aniversário ou Natal. É uma necessidade que lhe dá vida e razão de ser.
Como artista, não se compara, não se enquadra em movimentos, correntes ou modas.
É … Cargaleiro.
Senhor de um notável poder de observação e prodigiosa memória, guarda consigo as paisagens da Beira Interior que o viu nascer ou a luminosidade da margem sul do Tejo onde cresceu, mas também a vivência partilhada com a criatividade do meio artístico parisiense de que faz parte por mérito próprio há mais de seis décadas. A estas fontes que o inspiram Cargaleiro junta sempre um pouco de si e em toda a sua vasta e diversa obra é possível reconhecer o carácter único da sua autoria.
Elemento constante dessa consistência é o optimismo, a esperança, por vezes a alegria que transparece de cada obra.
E é por certo na universalidade desta mensagem que radica a admiração espontânea que tem captado em espaços culturais tão exigentes como França ou Itália onde se encontram algumas das suas obras mais emblemáticas.
“Eu sou … Cargaleiro”, pretende assim ser um contributo para o melhor conhecimento do artista e da sua arte que perdurará enquanto mensagem de amor à vida e crença na humanidade.
Bernardo Pinto de Almeida
Investigador e professor catedrático de História e Teoria da Arte
MANUEL CARGALEIRO:UMA VIDA DE ARTISTA
Manuel Cargaleiro acaba de completar 96 anos de vida, dos quais quase oito décadas foram preenchidas por aquilo a que se pode chamar uma vida de Artista. A cultura portuguesa lida mal com a ideia do que seja um artista e, também, com a compreensão de toda a dádiva que o ser artista representa. Desde logo para o próprio país em que nasce, para o seu povo, a sua memória e a sua cultura. Depois, pela muita dificuldade que o artista enfrenta para fazer valer a sua arte, que é na verdade a sua dádiva.
A obra de Manuel Cargaleiro nasceu cedo, e inicialmente ligada à prática da cerâmica, em que desenvolveu longuíssima e notável obra, a partir de 1945, expondo depois em 1949, numa mostra dedicada a mostrar a nova cerâmica portuguesa. Esta actividade continuaria depois pelas décadas fora, vindo o Artista a leccionar na Escola Preparatória de António Arroio, onde se iniciaram muitos dos que iriam figurar na história da arte portuguesa do século XX. Em 1954 conheceria, em Paris, Vieira da Silva e Arpad Szènes, entre outros artistas da chamada École de Paris, então no auge, como Bissière, que vieram a ter influência na sua futura obra. Bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian em 1958, iria cedo mostrar trabalho em Itália e Paris, onde residiu a partir de 1959, mostrando obras em imensas galerias de renome ao lado de artistas que ali viviam então como Jean Arp, Max Ernst e Camille Bryen na famosa Galerie Loeb, do grande e histórico galerista Edouard Loeb, o que lhe abriria as portas para uma nova e fulgurante carreira.
A sua vida em Paris foi coroada de sucessos. As obras da década de sessenta, quando se afirmou como pintor para além de ceramista, ficaram marcadas pela influência de Arp, cujas formas simples e recortadas o português adoptou na sua pintura, então construída de cores simples e discretas, encaminhando-se para um sentido de abstracção ambiental de delicada presença, que rapidamente encontrou um público. Mas seria mais tarde — já no encontro com a grande tradição do azulejo português, tradição riquíssima que influenciou igualmente Vieira e mesmo Paula Rego, com os seus motivos caprichosamente decorativos — que ele encontrou a sua via futura ao transportá-los para uma medida de composição aprendida com Vieira na estruturação ambígua do espaço, e que o levou a uma pintura que obteve considerável sucesso público.
Esse sucesso fez dele um pintor feliz. O grande reconhecimento nacional mas também internacional, a partir sobretudo da década de 80, levariam o pintor a uma carreira jamais interrompida em que foi, em boa medida, um verdadeiro embaixador da cultura portuguesa em França onde a emigração carecia de figuras que a credibilizassem e a enaltecessem para manter uma relação equilibrada entre os dois países. A sua presença naquele país e o grande reconhecimento que justamente mereceu das suas maiores instituições artísticas, onde se viu representado, ajudaram a impor sociologicamente aos franceses a noção da existência de uma cultura portuguesa que ia muito para além da representação, ainda então dominante, da figura do português reduzido à condição do exilado ou do migrante.
Foi assim, entre os muitos artistas portugueses que ali viveram — António Dacosta, Eduardo Luís, os do Grupo KWY e Júlio Pomar, além de Vieira e de outros — uma figura acarinhada e calorosa para com os colegas. A sua presença em exposições relevantes em galerias de renome ajudavam a que tantas vezes pudesse ser visitado por jovens artistas portugueses à procura da sua oportunidade.
A sua foi, verdadeiramente uma vida de artista, porque outra não quis, nem teve. Dedicado às suas artes, convivendo de perto com os grandes movimentos da arte europeia no pós-Guerra, já que todos passavam então por Paris, Manuel Cargaleiro ganhou a sólida reputação que lhe viria a merecer altas distinções e homenagens do Estado Francês além de forte representação em colecções privadas e públicas. A sua presença em Itália, onde além de inúmeras representações tem Fundação com o seu nome na encantadora cidade de Ravello, e onde a sua cerâmica é ainda hoje largamente reconhecida e apreciada pela sua qualidade e originalidade, fazem do nosso Artista uma figura importante da cultura e arte portuguesa do século XX.
A obra de Cargaleiro transporta assim como lição esse testemunho feliz: o de ter conhecido e vivido num mundo que, no seu tempo e espaço, em Paris ou Itália, no Japão ou em Lisboa, a sua condição de Artista acabou sendo reconhecida, permitindo-lhe fundir o trabalho e a vida numa unidade exemplar.
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